Tu e eu somos um baluarte, somos património, somos este pedaço de eternidade que cavalgou por cima da solidão e fez de duas almas não uma perfeita em simbiose mas duas vivas individuais e presentes.
Começo a acreditar, cada vez mais veementemente, que vivemos numa ilusão coletiva. Que o teu verde é diferente do meu, já o sei, porque vês castanho onde eu vejo preto.
O que eu mais quero é luz. Que se iluminem as noites, se acendam os candeeiros dos quartos, se desfaça o escuro em pedaços, se deixe o escuro estar no passado e seja mais simples ver.
Nasce hoje e agora uma menina do outro lado do mundo, filha de pais estrangeiros separados pela idade mas não pela vontade de vencer.
E no fim não há nada: quebrou-se a rotina, calaram-se os gaios e serviram-se bebidas geladas. Atormentado por um calor que corrói por dentro, resta persistir até que o frio regresse e com ele a previsibilidade e a clareza.
Em qualquer instância, independentemente do desgaste do momento, do saudosismo emergente, de uma resolução que teima em aparecer, há sempre um futuro por que lutar.
Está um céu fumado, sem se ver o horizonte / Um frio de cortar. Ninguém. Uma chuva miúda / Estão molhados os bancos, fechadas as farmácias.
Viver presumindo que o mundo é fundado em bondade é potencialmente fatal. Sei eu disto nas horas livres em que atravesso as ruas e aceno aos motoristas.
Hoje não faz sentido repetir a mesma fórmula de há um ano. Não sou o mesmo homem, nem sou confrontado com os mesmos desafios.
Se esta é a mais sublime humilhação, quero ser humilhado todos os dias. Dormir aqui e ser esbofetado pela mais nobre das sensações enquanto questiono a que ponto cheguei.