Seis em seis

Há ditados que crescem connosco, e porque chegam até nós pela boca de pessoas que respeitamos e admiramos, dificilmente serão apagados pelo peso do tempo. Um destes é a ideia de que mudamos de sete em sete anos, isto é, se pegarmos em qualquer pedaço de gente em qualquer momento da sua vida, puxarmos a fita do tempo a nosso bel-prazer sete anos para a frente ou para trás, encontraremos um indivíduo mudado nos valores, convicções e costumes.

Se é verdade que isto é bonito e glamoroso quando aparece numa varanda numa altura em que estamos rodeados de sonhos e grandes planos, também temos de admitir que não se coaduna muito com a realidade. Ora, vejamos, aos zero nascemos, aos sete sabemos lá o que é a vida, aos catorze detestamos ciências naturais, aos vinte e um somos vivos só à noite, e aos vinte e oito potencialmente estaremos a transitar para um estado qualquer que almejamos mas não temos bem a certeza se chegado o momento é aquilo que queremos. Proponho antes que consideremos este ditado mas de seis em seis anos. Aos zero, é certo, começamos do mesmo lugar, mas aos seis estamos a aprender a ler, aos doze a desenvolver espírito crítico, aos dezoito a mudar de cidade, aos vinte e quatro a viver por conta própria e por aí em diante.

No decurso disto, pudemos estrear-nos em sensações, escrever poemas com género, que é absolutamente mágico mas quase tão pretensioso como tentar definir o amor, estava ele bem por definir, sentir fascínio por tudo o que move apenas porque é novo e não por ser extraordinário, porque extraordinário é o que tiramos disso e que tantas vezes descuramos. Caímos em praças, brilhamos, ficamos sem ar, andamos em círculos e ficamos sem saber onde estamos. Aprendemos a ouvir, aprendemos a ouvir os outros, que vão em comboios mudar de vida, em trilhos contar as suas histórias, que nem sempre têm esperança dentro mas nem por isso são menos humanas, e, quase sempre, recomendamo-los a saltar, querendo crer que cairiam ilesos no chão e não teriam o azar de perder a voz.

Demos o nosso melhor. Mudamos. Mudamos muito. Mudamos a cada abril. Mudamos a cada dia. Então, façamos mais balanços, menos balanços, os balanços que entendermos por bem fazer, sempre que entendermos, porque a vida é nossa, somente nossa, e, disto já sabemos, não tem nenhum sentido para além daquele que impomos, ou talvez não, porquanto nos momentos mais especiais torna-se muito claro o que realmente importa.