Maioridade. O tão desejado marco dos últimos anos da minha vida chegou, sem pressas, e está aqui para ficar até ao fim dos meus tempos.
Longe estão os anos da meninice. Voltar atrás no tempo gera uma nuvem de fumo, que se desvanece a espaços para dar lugar às mais longínquas memórias. Tinha eu quatro, cinco anos quando toquei a campainha do vizinho sem o perceber. Ouvi a voz da mulher e desatei a correr, de coração aos pulos, nuca suada e tremuras nas pernas. Foram cem metros intensos. Hoje, seriam de absoluta tranquilidade, ou nem seriam percorridos, tivesse eu pedido desculpa pelo engano, como é lógico.
Ao longo dos anos, aprendi a lidar com pessoas. Adquiri conceitos essenciais como a boa educação, bem como o seu carácter imperioso para o bom funcionamento da vida em sociedade. Fui notando, por outro lado, desgaste, um julgamento que desaparecia após um sossegado diálogo comigo mesmo. Passei então a ceder, aprendi a ceder, de um jeito nem sempre muito ortodoxo mas que me tornou no homem que sou hoje.
Tive uma infância longa, tão bela e única que ainda agora acabou e já sinto um amargo de boca, uma saudade palpitante, um sentimento de perda de algo que não volta mais.