Corajoso é este rapaz que ergue esta rapariga com os braços e a coloca a voar, e nisto voa também no seu mundo interior com a imagem dela em ponto grande enquanto ela voa por cima de si. Não tem nada a temer. Conhece bem o seu corpo, sabe como o equilibrar em todas as posições, não fossem eles conhecidos de longa data, que só não se equilibraram mais cedo porque o tempo e as circunstâncias não o permitiram. Por fim, estando os dois sós e sem nada com que especular, podem ser felizes. Podem voar. Parece que a rapariga voa mesmo, agora que se desequilibra, desliza pelos braços dele e cai de cabeça para trás, bate contra o chão, perde imediatamente os sentidos e como que se desliga para sempre.
Desculpa, és português, Sim, Olha, desculpa, mesmo, eu estou há três dias nisto, podes ajudar-me com alguma coisa, Amigo, eu não devo ter dinheiro, vou ao bolso e dou-lhe a nota de dez que tenho porque apesar de tudo a minha vida ainda vale mais que isso. Ele pega-me na nota muito calmo e dá-me um abraço, Deixa-me acompanhar-te. Caminhamos juntos quinze minutos. Não sei o que fazer, eu estou num beco sem saída, perdi todo o amor à vida, estou metido em vícios, nesta doença, e é tudo sentimento, sabes, álcool, drogas, sexo, internet, anorexia, bulimia, é tudo o mesmo, Eu sei, eu sei bem disso, mas tens de te levantar, Eu sei, mas estou desempregado, com quarenta e três anos, estou muito em baixo, não me posso meter em algo de responsabilidade neste estado, já trabalhei em grandes empresas, sou técnico eletrotécnico, tenho curso nível quatro, mas agora não consigo, o meu irmão é casado, tem dois filhos maravilhosos, e eu não sei valorizar isso, Já experimentaste fazer terapia, Sim, já fiz de tudo, estive em todo o lado, estive três semanas em Alcobaça em reabilitação, Pois, não sei mais que te dizer, mas levanta-te, mexe-te, Amigo, fizeste-me o dia. Demos outro abraço, eu segui em frente para Matosinhos e ele por uma rua qualquer da foz.
Como é bonita a areia à noite.