Babel

Encontrávamo-nos amiúde no Jardim das Virtudes pelo final do dia. Eu escapulia-me do trabalho nunca depois das seis para me perder nos olhos dela tingidos de púrpura-mar ao passo que ela descrevia para mim as horas, as preocupações, as ilusões e as paixões que a moviam e, frisava, faziam da vida uma constante descoberta. Fizemo-lo vezes sem conta, sentados ao sol de primavera, na noite de São João alumiados pelos balões que tomavam os céus, no Natal pouco antes de regressamos às famílias, sempre que nos aprouvesse dizer que não à solidão que impregnava os caminhos sinuosos que trilhávamos quando não estávamos juntos.

Recordo com pesar o primeiro dia em que tive de a interromper, porquanto não estava a conseguir chegar a ela; era evidente que distávamos mais que o normal, não sabia era por que razão. Tentamos de tudo; ela teve aulas de línguas, eu de retórica, mas não mais vi púrpura-mar nos olhos dela, e ela jura que, frequentemente, não a beijava como antes.