Autoproclamação

Se um dia ao acordares atentares no teu corpo e, após uma análise cuidada, tiveres que tens uma mão da qual não emanam trevas, chegarás rapidamente à conclusão de que as tuas atividades diárias viram o seu nível de dificuldade depreciado, porquanto ficou simples torcer o objeto do destino com as mãos, os desejos tornaram-se edifício imaterial explanados em papel. Quando a seguir decidires questionar por que razão não reparaste nisto antes, extrapolares os traços de personalidade que mais resultaram na perda de ti mesmo a que retornaste agora, atribuíres as culpas a certos padrões ambientais que enfim te tornaram nessa amálgama de coisas por dizer e sentimentos pouco processados, ansioso desequilibrado nas decisões, sabe que nem Freud teria a coragem de trazer a mãe à equação, poupemo-la disso, pois faz tão bem o seu papel e nos ama tanto, nem Jung traria os seus arquétipos para te colocar numa caixa e contar a história da tua vida como nunca a viste. Fundamentalmente, há que colocar a possibilidade de, desprovidos aqui de alguma capacidade de abstração, o que não parece mau de todo, seres um bocado idiota, e isto, inevitavelmente, ter potencial para te proporcionar as experiências mais fenomenais e dolorosas que, no leito de morte, vais contar aos teus filhos.